A semana é de Banana Bowl no Brasil e mesmo estando um pouco distante, com os meus novos afazeres ligados ao “Lixo Extraordinário,” não estou ausente.
Reproduzo aqui a matéria que fizemos na edição 111 da Tennis View com a Roberta Burzagli, hoje técnica da ITF e última brasileira a ganhar o Banana Bowl, nos 18 anos.
Vale a pena ler o material produzido pela Fabiana de Oliveira, em que a Roberta analisa o tênis feminino no Brasil e no mundo de hoje, com o olhar de quem participa do circuito e relembra a conquista.
Roberta Burzagli, hoje técnica de destaque na ITF e última brasileira a vencer o torneio, há 20 anos, analisa o tênis atual e relembra a conquista
No dia 14 de março começa no Brasil, mais precisamente na cidade catarinense de Blumenau, a disputa da 41ª edição do Banana Bowl, uma das principais competições juvenis do mundo. Com a proximidade do torneio, aumenta nos brasileiros a expectativa de quebrar o jejum de 19 anos sem uma representante no topo do pódio.
A última brasileira que triunfou no Banana Bowl foi a paulista Roberta Burzagli, em 1991, há exatos 20 anos, na sua última temporada como juvenil e mostrou toda sua garra ao saltar do pré-quali para a conquista do troféu de campeã. Isso, sem se deixar se abater por adversidades como falta de técnico e de verba, rodada dupla no último dia de torneio e disputa da final sem muito glamour, em uma quadra isolada do Tênis Clube de Santos.
Na semana seguinte à realização do Banana Bowl, o País sedia outra importante competição mundial, que se iguala a um Grand Slam juvenil, a 28ª edição da Copa Gerdau, em Porto Alegre (RS), que dá ainda mais pontos do que o Banana Bowl. Foi lá que, na temporada passada, o baiano Silas Cerqueira faturou o troféu de campeão dos 14 anos.
A seguir, Roberta Burzagli, que atualmente integra o quadro de técnicos da ITF e viaja com juvenis em ascensão de diversos países, faz uma ampla análise das dificuldades enfrentadas pelas meninas no circuito, do que ela imagina de ideal na relação entre imprensa e tenista juvenil e admite ser uma técnica rigorosa, sem deixar de estar atenta às necessidades das tenistas. Em um trecho, ela ainda lamenta que a competição tenha perdido seu formato original.
“Por muitos anos, [o Banana Bowl] foi jogado em clubes de grande porte, como o Pinheiros e o Paineiras, com todas as categorias juntas e os tenistas mais jovens podiam ver e até treinar com os mais velhos, o que era uma coisa muito boa para o desenvolvimento dos jogadores e do esporte. Naquela época, havia um grande comparecimento não só de pais, mas de um grande público, fã do esporte no Estado de São Paulo. Eu acho que, por tudo isso, antigamente os tenistas davam sim mais importância para o Banana”, ressaltou. Confira mais trechos da entrevista.
Tennis View – Quais são as diferenças que você vê no nível da chave do Banana Bowl, se compararmos a que você pegou há 20 anos e as que atualmente são formadas?
Roberta Burzagli – Eu acho que as chaves de antigamente eram mais fortes do que hoje. Além disso, na época em que eu ganhei o Banana Bowl, não havia tantos torneios ao redor do mundo como hoje, o que impede que todos os bons jogadores se reúnam num mesmo torneio. Antes todo mundo vinha jogar o Banana Bowl, hoje há várias outras opções em outros lugares.
TV – Na sua opinião, porque o Brasil está há vinte anos sem uma campeã no Banana Bowl?
RB – Ah! Isso é complicado. Hoje, depois de já ter uma certa experiência como técnica no Circuito COSAT, com a Federation Cup e depois com a ITF em torneios na Europa, na minha opinião essa é uma questão complexa que começa com problemas culturais e geográficos, que por sua vez geram dificuldades para que as meninas viagem para disputar torneios. O Brasil, ao contrário dos países da Europa, é um país de longas distâncias, sem ferrovias e com estradas precárias, deixando praticamente como única opção o transporte aéreo, que é caro. Já na Europa e nos Estados Unidos, se pode viajar de trem e de ônibus a um preço bem mais barato, isso para não falar na questão da segurança, o que para as meninas tem mais peso do que para os meninos. Elas têm que viajar sempre com mais alguém, fazendo com que o preço da viagem dobre. É um problema para os pais, que relutam em autorizá-las a viajar. Isso provoca uma diminuição do número de jogadoras, ou seja, você pode até ter um número grande de meninas jogando aos 10 ou 12 anos, que não exige muita viagem, mas quando elas começam a ter que viajar, aos 14 ou 15 anos, esse número começa a diminuir muito. Essa situação acaba fazendo com que os torneios fiquem escassos de jogadoras, sendo que as melhores jogadoras acabam enfrentando jogos difíceis apenas nas semifinais ou na final. Assim sendo, o desenvolvimento da parte técnica e mental fica comprometido, pois é a competitividade e rivalidade entre os esportistas que faz com que o nível do jogo melhore. Infelizmente, nossas meninas quando se deparam com meninas vindas da Europa e dos Estados Unidos, apesar de muito talentosas, não tiveram as mesmas condições de desenvolvimento que as estrangeiras. O bom seria se essas meninas pudessem viajar sempre juntas, com uma técnica e uma equipe de preparação física, com condições de segurança adequadas e com a questão financeira resolvida, como é na Austrália, nos Estados Unidos e na Europa.
TV – O que você fez de certo para ganhar o título do Banana Bowl, em 1991?
RB – Eu não sei se foi certo ou se foi errado. Mas era um momento na minha vida que por questões financeiras eu nem estava jogando o Circuito COSAT, tanto é que eu não tinha ponto nenhum no juvenil e tive que disputar o pré-quali do Banana Bowl, apesar de já ter um bom ranking no profissional. O único torneio que eu podia jogar era o Banana Bowl, pois foi realizado em Santos naquele ano. Então eu treinei sozinha no Paineiras e foquei minha atenção no torneio. Eu treinei super sério, mas eu estava sem pressão nenhuma. Acho que joguei para mim mesma e não para os outros. E isso é muito importante para qualquer coisa que você faça na vida. Eu me diverti no torneio e realmente estava curtindo aquele momento. Você tem que fazer as coisas por prazer e isso não significa que não tenha que treinar e se dedicar, mas apenas balancear as coisas, além de querer muito.
TV – Na final do Banana Bowl, você jogou na última quadra do Tênis Clube de Santos. Você acredita que a grande exposição dos juvenis, com imprensa, fotógrafos e etc, atrapalha o desenvolvimento do juvenil?
RB – Eu acho que quando existe um assédio exagerado da imprensa, isso atrapalha. Mas não ter cobertura nenhuma também não é bom. Muitas vezes, quando o assédio da imprensa, patrocinadores e empresários é muito grande, o jogador juvenil passa a se sentir como um profissional antes mesmo de ter chegado a esse nível. E quando ele deixa de ser juvenil ainda tem uma longa caminhada pela frente. O exagero pode prejudicá-lo tanto nos resultados, como nas partes emocional e mental. No meu caso, o fato de eu ter jogado na última quadra não me ajudou em nada. Eu gostava de jogar com público e me sentia bem. A imprensa, naquele torneio, tão pouco deu uma cobertura muito grande a minha participação e à vitória. Eu acho que isso me prejudicou um pouco, pois se eu tivesse tido chance de estar mais em evidência, talvez tivesse conseguido patrocínios para continuar. O ideal é o equilíbrio entre todas essas coisas.
TV – Devido a uma lesão, você foi forçada a interromper sua carreira aos 19 anos de idade, quando você jogava em alto nível. De que maneira você utiliza essa experiência no seu trabalho como técnica da ITF?
RB – Apesar de me considerar uma técnica muito rigorosa nos treinamentos, pois as jogadoras da equipe da ITF estão a beira do profissionalismo e o trabalho tem que ser muito minucioso, eu também tento aliviar a pressão das meninas entre os torneios. Como o tempo do circuito é longo, com até nove semanas seguidas, sempre que surge uma chance, tento tirá-las um pouco do ambiente do tênis para espairecer e também para que elas aprendam coisas diferentes.
TV – Para você, qual a importância do Banana Bowl?
RB – Para mim o Banana Bowl é e sempre vai ser importante, pois foi um momento muito especial na minha vida. Além disso, o Banana traz uma aura toda especial, pois grandes tenistas já jogaram o torneio (Sabatini, Lendl, McEnroe, Muster, Roddick, Baghdatis, Coria). Lembro quando eu tinha 11 anos que a Silvana Campos ganhou e naquele tempo nós duas treinávamos com o mesmo técnico, o já falecido Sergio Ferreira. Eu estava com ela recebendo o troféu e ela me disse que eu seria a próxima a ganhar na categoria 18 anos. Isso ficou na minha memória de alguma maneira e quando eu ganhei liguei para ela pra dizer que sua previsão havia se concretizado.
Fabiana de Oliveira