A temporada já acabou, os tenistas todos já estão em plena preparação para 2012, nas suas pré-temporadas pelo mundo.
Agora é o momento de relembrar como foi 2011 e homenagear Novak Djokovic, o destaque disparado do ano.
Para isso posto aqui a entrevista que a Tennis View, com Edgar Lepri, Leonardo Stavale e Nelson Aerts, fizeram com o homem que levou Novak ao topo, o técnico Marian Vajda, em Nova York, publicada na edição 116 da revista.

Vajda, o treinador que transformou Djokovic no melhor tenista do mundo
Qual o trabalho por trás do tenista de Novak Djokovic? Quem é o treinador capaz de fazer o sérvio passar Roger Federer e Rafael Nadal para disparar na liderança do ranking da ATP? O nome dele é Marian Vadja, um ex-tenista profissional, que chegou ao 34º lugar no ranking e vencedor de dois torneios ATPs. Feitos que parecem pequenos quando comparado às conquistas obtidas na sua segunda carreira.
Após parar de jogar por conta de uma lesão e se afastar do circuito para curtir a família, por volta dos 30 anos Vadja foi seduzido a iniciar a carreira como técnico ao ser convidado a trabalhar com o eslovaco Domink Hrbaty, na época 320º do mundo. Para quem estava começando na profissão, Vajda não tem do que reclamar. Hrbaty foi o 14º melhor tenista da ATP, campeão de seis torneios e uma semifinal em Roland Garros.
Depois o treinador teve ainda boas experiências com Karol Kucera e embarcou no tênis feminino até receber a proposta há cinco anos de treinar a então jovem promessa Djokovic. De lá para cá, a história ficou conhecida, e muito. A relação de Vajda com Djoko vai além das quadras. O próprio tenista já afirmou que o treinador é como um segundo pai para ele. O treinador não é nenhum mágico, aparentemente sua grande maestria e genialidade é a capacidade infinita de entender como funciona a mente de seu pupilo.
Nesta entrevista exclusiva à Tennis View, realizada durante o US Open, Vadja destaca o fato de ter sido jogador como um diferencial no seu dia a dia como técnino. Diz saber saber a hora de dar um descanso, puxar um treino mais forte e motivar o jogador na medida certa. O treinador afirma também que a paciência é uma de suas maiores virtudes e que passou isso para Djoko quando o tenista ansiava por chegar ao topo. Confira esses e outros segredos do homem que transformou Djokovic no melhor tenista do mundo.

Tennis View – Quando você se envolveu com tênis?
Marian Vajda – Eu tinha 10 anos e morava na Eslováquia, em Piestany, onde eu cresci. Fui apresentado ao tênis pelo meu pai, que tinha construído uma quadra na cidadezinha e tinha muitos bons técnicos me acompanhando.
TV – Como você avalia sua carreira como profissional? Você acha que poderia ter ido mais longe?
MV – O tênis era minha paixão, mas eu comecei a jogar profissionalmente muito tarde, com 18 anos, quase 19. Entrei no top 100 quando tinha 20 anos e meu objetivo, obviamente, era o de todo jovem tenista: ser o melhor do mundo. Sempre via Wimbledon quando era criança e sonhava com aquele troféu. Não realizei esse sonho, mas pude ganhar dois torneios de ATP Tour, fiz outras duas finais… Quando eu olho para trás, me sinto muito satisfeito. Talvez eu pudesse ter alcançado mais coisas, mas eu fui incapaz por minha carreira ter terminado com uma lesão, então parei com 30 anos.
TV – Quando você começou a ser treinador?
MV – Depois dos 30 anos, fiquei um tempo cuidando da minha família e senti que gostaria de voltar para o tênis. Tive uma proposta de treinar uma boa promessa, Dominik Hrbaty, que na época era 320º do mundo. Nós fizemos um período de experiência para ver se seria bom e eu realmente passei a gostar. No início eu ficava muito cansado, porque era completamente diferente a carreira de treinador e jogador. Eu precisava focar naquilo que ele estava fazendo, e não mais em mim. Mas começamos a trabalhar juntos, eu gostei e passei a me motivar, porque ele também tinha muita vontade de crescer. Foi assim que comecei como treinador, aos 31 anos e até hoje.
TV – Então você já começou com um trabalho muito bom?
MV – Sim, eu tive sorte desde o começo. Ele melhorou muito, fez mais de dez finais, foi semifinalista de Roland Garros e quase um top 10. Foi muito gratificante. Eu recebi muito crédito e sei que fiz um bom trabalho, mas estava com um jogador muito bom. Depois disso eu pensei que não conseguiria mais pegar nenhum bom jogador. Ele foi 12º, isso é o melhor que a gente consegue [risos]. Mas então eu ainda treinei Karol Kucera por dois anos e meio, trabalhei para a Federação por um ano e meio, depois um pouco no feminino…
TV – E como surgiu a oportunidade de treinar Novak Djokovic?
MV – Em 2006, eu recebi uma grande proposta da equipe que conduzia a carreira do Novak. Eles se lembravam de mim por ter treinado Dominik, mas eu não sabia quem o Novak era, porque na época eu estava treinando meninas. Aí eu fui para Paris, conheci os pais, a família e ele. E esse foi o início. Também tivemos um período de experiência, por cinco ou seis semanas, ele ganhou o primeiro torneio… E foi assim que tudo começou, de Wimbledon em 2006 e chegou ao auge agora [risos], com uma conquista em Wimbledon, então foi muito legal. Em cinco anos, ele alcançou o número 1 do mundo, o que foi realmente inacreditável. Ele é um cara muito talentoso e tenho muito sorte de contar com esse talento.
TV – Qual você acha que foi a grande mudança de Djokovic no último ano?
MV – Ele mudou muito mentalmente, sabe? Mas, em cinco anos de trabalho, ele sempre teve a ambição de ser número 1 do mundo, um desejo mesmo. E ele sempre conseguiu evoluir. Ele trabalhava em todos os golpes. Por exemplo, há um ano e meio o saque dele não estava muito bom. Trabalhamos com isso, depois o forehand, tudo da base. Hoje, ele tem esses movimentos praticamente perfeitos.
TV – E a diferença entre passar de top 3 para número 1 do mundo, o que mudou?
MV – Foi muito duro. Acho que ele percebeu algumas coisas importantes e está mais maduro. Se ele pode bater os números 1 e 2 do mundo, se ele pode ganhar a Copa Davis, ano passado, – o que o ajudou muito -, ele percebeu que poderia ser mais agressivo, mais rápido, fisicamente ele estava muito bem no final do ano, e isso tudo se juntou neste ano.
TV – Quais foram as mudanças físicas?
MV – Bem, ele parou de consumir glúten e reduziu muito o açúcar. Ele perdeu alguns quilos, está mais magro e muito mais rápido em quadra.
TV – O que é necessário para ser um bom treinador?
MV – É preciso ser paciente, viajar muito… ser paciente [risos], e é uma carreira dura. Você não pode ser dominante. Você precisa deixar o cara dominar, precisa ouvi-lo, ser muito paciente e definir metas, como evoluções em longo ou curto prazo. Mas você precisa ser muito paciente, porque você está diariamente com o cara, 24 horas por dia, e às vezes é difícil controlar os nervos, sabe? A carreira no tênis me ajuda, porque eu passei por isso como tenista e tive muitas experiências. É importante não confundir o jogador ao falar de algo que ele não está tão bom, mas ser paciente e melhorar aquilo. Teve um tempo em que ele estava muito para baixo e eu sempre dizia: ‘Você precisa ser paciente, você vai virar número 1. É um passo de cada vez, não vai ser de um dia para outro’. O mais importante é acalmar o tenista mentalmente, o que não é fácil.
TV – Você acha que ajuda muito ter sido um tenista profissional?
MV – Sim, definitivamente. Ajuda muito. Porque eu conheço tudo, todos os torneios, a programação de cada dia. Com o que eu fiz, eu posso dar exatamente o programa de treinos a ele sem causar overtraining, porque há treinadores que forçam demais, sabe? Eu tive sorte de conhecer boas pessoas na minha equipe, na preparação física, alimentar, na fisioterapia e sempre nos comunicamos. E a comunicação é muito importante, especialmente com ele (Djokovic), porque ele sabe identificar as coisas, então o que ele sente, ele conta para a gente. Ele é aberto com a equipe e tem muita sensibilidade nesse aspecto.
TV – E ele faz muito preparo físico?
MV – Acho que ele faz o mesmo que os outros, mas ele tem uma capacidade boa e pode “sintetizar” os exercícios muito, muito, muito mais rápido. Ele consegue aprender as coisas muito rapidamente e seu estilo de jogo é muito intenso. Por exemplo, atualmente, ele fica duas semanas sem jogar, volta para o circuito e joga do mesmo jeito. Enquanto muitos tenistas precisam de uma semana ou duas para retomar o ritmo. Então, isso é um talento, um dom.
(Fotos de Cynthia Lum)